Meditação Mindfulness, Autocompaixão, Psicoterapia

Mitos acerca de Meditação Mindfulness

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Mitos acerca de Meditação Mindfulness

Existem uma série de mitos e ideias pré-concebidas acerca do que envolve a meditação e meditar.  Este artigo pretende esclarecer um pouco este tema, em particular no âmbito da meditação mindfulness, ou de atenção plena.

 

  1. Meditar não é uma ideia ou um conceito teórico a entender. É um processo vivo que tem que ser experienciado. A teoria é como o mapa do território, mas em algum momento teremos que colocar os pés no caminho. O entendimento dos conceitos é como o dedo a apontar a Lua, não é a Lua. Para que a meditação traga benefícios, aprendizagem, crescimento, precisamos de praticar com continuidade e consistência.
    Meditar também não é uma técnica que nos ajudará a pensar melhor. Isso poderá ocorrer (e ocorre) mas como consequência. Meditar tem mais que ver com observar o fluxo da vida, permiti-lo e aprender com essa observação.
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  2. Meditar não é controlar os pensamentos ou tentar parar de pensar. Tentar parar de pensar só cria mais tensão e agitação mental. Experimente a fechar os olhos e a tentar durante 20s não pensar num urso polar branco. Rapidamente vai perceber que não se consegue controlar a nossa mente, só vai criar mais tensão e cansaço mental.
    Os pensamentos são um dos componentes da nossa experiência, como afluentes de um rio. O que se pretende é observar os pensamentos com abertura, sem lhes dar demasiada importância, sem necessariamente acreditar neles, sem lhes colocarmos a nossa energia. Deixar que surjam e que cessem. Escolhemos deliberadamente não alimentar mais os pensamentos e com isso deixamos os pensamentos ir, deixamos estar. Na medida em que formos permitindo a nossa experiência, com o tempo, poderá haver uma tendência para a mente se aquietar e os pensamentos irão reduzir-se substancialmente. Mas isto é uma consequência e não um objetivo.
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  3. Meditar não é só para as pessoas calmas e tranquilas, antes pelo contrário. Pessoas com mais energia, mais irrequietas ou com tendência para o movimento constante, podem beneficiar bastante da meditação. As pessoas com este perfil ficam por vezes rapidamente frustradas ao experimentar a parar para observar a sua experiência. Sentem que são um fracasso na meditação. É importante perceber, que, por um lado, a meditação é uma forma de reconhecermos e aceitarmos todos os aspectos de quem somos, até o nosso lado que tem dificuldade de parar, o nosso lado mais ansioso, o nosso lado que critica ou julga. Meditar é particularmente importante para pessoas com esse perfil para poderem observar o seu ritmo, ensaiar a possibilidade de desacelerar sem um sentimento de culpa que tantas vezes surge por não estar a fazer algo. Aqui por vezes entram também crenças inconscientes de que não me posso permitir desacelerar ou parar, ou serei inútil ou sem valor aos olhos da sociedade.Por outro lado, há várias modalidades de meditação, algumas mais dinâmicas com movimento consciente, como a meditação a andar, o mindful eating, etc, que permitem o treino da atenção em movimento. Pessoas que têm este perfil mais enérgico podem começar com práticas dinâmicas, e mais adiante, se fizer sentido, ir intercalando com práticas mais estáticas.
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  4. Não há apenas um tipo de meditação. Há inúmeros tipos de meditação. Há meditações mais dinâmicas, com movimento, outras mais estáticas. Umas focam-se mais em determinados componentes da experiência como imagens, outras poderão focar-se mais nas sensações, outras em reflexões em torno de uma palavra ou tema, outras ainda abarcando toda as dimensões da experiência. Umas focam-se mais no treino da atenção, outras no desenvolver de qualidades e outras na investigação de aspetos da realidade.
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  5. Meditar não é procurar um estado de paz em que não sentimos as dificuldades da experiência humana. Isso é evitar ou reprimir a experiência. Disso já temos que chegue na nossa vida. Meditar é ir ao encontro e encarar tudo o que possa surgir na nossa experiência (o bom, o mau e o vilão). Meditar é aprender a estar com, e observar o fluxo contínuo de experiência que a vida traz. Se procuramos um estado mental estático em que nada se passa, não há progressão no caminho, não há aprendizagem nem crescimento espiritual. É verdade que por vezes com a continuidade da prática, se experimenta a quietude, a tranquilidade e o contentamento. Mas, mais uma vez, isto é uma consequência e não um objetivo.
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  6. Meditar não é uma técnica de relaxamento. Por vezes a meditação é confundida com relaxamento. Apesar de por vezes a meditação trazer um relaxamento natural ao corpo e mente, isto é uma consequência e não um objectivo. Ajuda ter um certo nível de relaxamento no corpo e mente para meditar, de forma a haver acolhimento e abertura à experiência, no entanto, este relaxamento deve estar sempre equilibrado com vitalidade, presença, empenho e foco.
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  7. A meditação vai deixar-me tranquilo desde o primeiro momento. Não necessariamente. A meditação nem sempre é uma via rápida para uma mente tranquila. Numa fase inicial da prática é comum ocorrer uma tomada de consciência sobre hábitos e comportamentos não saudáveis no nosso corpo e mente. Esta tomada de consciência pode até dar a sensação de que a meditação me está a criar ainda mais pensamentos e agitação mental. Na verdade estou apenas a tomar consciência do estado em que a minha mente se encontra na maior parte do tempo. É por isso que é importante praticar sob a orientação de um professor experiente e qualificado, capaz de dar o aconselhamento necessário de como lidar com tais experiências.
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  8. Meditar não requer pertencer a uma religião, ou ter alguma crença religiosa. É verdade que a meditação tradicionalmente tem estado bastante ligada a religiões e tradições contemplativas, no entanto não é necessário ter qualquer crença para meditar. A faculdade de escolhermos onde e de que forma colocamos a nossa atenção é uma qualidade ao alcance de todos os seres humanos e pode e deve ser treinada. A prática de mindfulness tem origem na tradição budista, no entanto é apresentada numa linguagem laica e desprovida dos aspetos que podem ser conotados com religiosidade e vida monástica.
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  9. Meditar não implica conseguir estar em posturas corporais complicadas. Por vezes há a ideia de que para meditar precisamos de estar em posições difíceis como se vê nas estátuas do Buda em flor de Lotus. Na verdade, pode-se meditar em qualquer postura corporal: de pé; a andar; sentado no chão ou em cadeira; ou deitado. Em particular, para quem está a dar os primeiros passos com a prática de meditação, importa encontrar posturas confortáveis. É verdade que a postura corporal tem uma influência na nossa mente, no entanto, de inicio, não adianta acrescentar desconforto fisico indo para posturas dificeis de atingir, não traz vantagens à aprendizagem. Só quando tivermos uma prática de meditação estabilizada, com algum tempo de aprendizagem é que faz sentido começar a explorar posturas físicas mais “refinadas”.
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  10. Será que eu já medito naturalmente? Algumas pessoas referem que quando estão a correr, a dançar, a pescar, a desenhar, etc, entram em “fluxo” ou “na zona” e por isso já meditam. Isto poderá ou não ser verdade, consoante nesses momentos estivermos ou não a cultivar os vários elementos obrigatoriamente presentes na meditação mindfulness: atenção, intenção, aprendizagem.
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  11. Não tenho tempo para meditar. Este é um dos motivos apontados por muitas pessoas para rejeitar precocemente a prática de meditação. Há um ditado que diz algo como: “Se achas que não tens tempo para parar e meditar 10 minutos, então precisas de meditar 20 minutos.” Dizer que não se tem tempo para meditar, equivale a algo como dizer que não se tem tempo para parar e comer, ou parar e lavar o corpo. Quase sempre a pessoa tem uma gestão de prioridades pouco sintonizada com o que lhe faz bem. Meditar é um ato de sanidade mental e existêncial e uma forma de “digerir a vida”. Precisamos de criar tempo e espaço nos nossos dias para cultivar silêncio, aquietar a mente discursiva e simplesmente observar o fluxo de experiência desde um lugar consciente. Estar sempre a fazer coisas, a analisar, a pensar, a planear e a tentar controlar a vida, é um pouco como alguém que acaba de comer uma refeição e começa logo de imediato a comer novamente, sem dar tempo para a digestão e integração dos novos nutrientes. Muitos de nós sofrem da crença de que “o mundo se irá desmoronar se me permitir parar”. Esta crença é muitas vezes o catalizador da ansiedade e burnout.

 

Texto escrito em Junho 2024

Filipe Raposo

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